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Já conviveu com o fracasso?



Já conviveu com o fracasso? Eu já, e é horrível, péssimo. E foi assim que eu me senti quando terminei a pedalada por treze estados brasileiros que fiz em 2016, quando me propus a realizar um trabalho de sensibilização sobre o consumo consciente sobre a água.



Enquanto pedalava, lia e conhecia mecanismos de isenção fiscais para empresas financiarem trabalhos educacionais e culturais. Me apoiando nestas leis, eu conseguiria, de forma gratuita, levar para o maior número de escolas possível a pergunta “qual é o valor da água para você?”, que idealizei durante a pedalada. Buscando através dela e das imagens que fui captando pelo caminho, propor o debate ambiental ao brasileiro.

A proposta de sensibilização e educação ambiental em torno do consumo da água foi surgindo, quando, em 2015, dois fatos marcaram meus pensamentos durante a pedalada.

O primeiro foi a redução do volume de chuvas e de água no Cantareira, que causou racionamento e falta de água na grande São Paulo. O segundo foi o rompimento da barragem de rejeitos de mineração em Mariana-MG que provocou 19 mortes e a destruição da vida no rio Doce.

E, em dezembro de 2016, eu terminei o pedal com as imagens captadas e as histórias coletadas pelo nordeste e suas cenas de seca, da transposição do rio São Francisco e da remada pelo rio Doce, assoreado de rejeito durante vinte e oito dias. Eu tinha certeza de que conseguiria propor o debate ambiental às escolas e ao povo brasileiro por meio de um documentário realizado pelos incentivos fiscais como a lei Rouanet e do PROAC-ICMS. Consegui duas reuniões com agências de publicidade e com uma produtora audiovisual. Eu tinha certeza que o Pedalágua conseguiria concluir sua missão o mais rápido possível. Mas...

Uma entrevista que uma filial da Globo realizou quando eu descia o rio Doce acabou com minhas pretensões. Os entrevistadores foram sensacionais e a matéria retratou fielmente o que estava ocorrendo sem alterações ou desvio de informação, mas em uma fala eu disse que o rompimento da barragem da Samarco/Vale foi um crime ambiental.

O problema é: eu não tenho como provar que foi um crime. Um rio assoreado de lama de rejeito tóxico, 19 mortes, cidades sem água potável, pessoas e comunidades inteiras proibidas de pescar e de se banhar e proliferando, assim, a sua cultura. Com todos esses fatos eu não posso dizer que o rompimento da barragem foi um crime.

O maior crime (até então, hoje já ocorreu o rompimento da barragem do Córrego do Feijão, também em MG) ambiental da história do país. As agências de publicidade e a produtora audiovisual que eu consegui apresentar o projeto Pedalágua, ao verem essa entrevista e algumas outras postagens a forma como eu me portava, me consideraram radical demais. Fui inocente ao me apresentar de forma muito franca e sem apresentar um projeto com viabilidade econômica. Acreditei que só a boa ação de propor o debate ambiental sem me preocupar com uma base financeira de geração de lucros ou engajamento para patrocinadores seria suficiente. Não foi.

Mudei as formas de me apresentar e de abordar os novos prováveis futuros patrocinadores, mas, no mundo financeiro, aprendi que nunca teremos duas chances. Passei 2017 e 2018 buscando mostrar um projeto educacional sobre questões ambientais e conseguir promover o debate ambiental no Brasil sem preocupações com lucro seria viável e atrativo para alguém. Algumas empresas achavam bonito e gostavam da ideia de ter pessoas no mundo preocupadas com um futuro melhor nas questões hídricas.

Mas eu não consegui os incentivos fiscais. E por isso a pergunta no início deste texto sobre a questão do fracasso. Tentei me moldar ao que as empresas queriam e mesmo assim não consegui. Desisti. Aceitei que cometi muitos erros e pensei em abandonar a ideia. Mas, agora, em 2019, um novo crime (e agora eu posso chamar do que eu quiser) ocorreu. A cidade de Brumadinho ficou soterrada de lama e com 272 mortes (270, mas duas mulheres estavam grávidas). Como dizer que não foi um crime ambiental?


"Excesso de expectativa é o caminho mais curto para a frustração."


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